Todo mundo associa o ato de comer à sensação de prazer. Isso é claro e simples de entender, uma vez que o cérebro produz a sensação de satisfação, fazendo com que a gente busque comer para não morrer de fome.
A questão é: quando esse prazer se torna um problema? Quando nos preocupamos mais com o prazer de comer e deixamos de pensar na dor do abuso?
Tenho uma história que ilustra bem isso. Aconteceu quando eu, antes de entrar para a Meta Real, dei carona para uma amiga.
Na noite anterior, havia me deliciado com bifes à milanesa, devidamente empanados e engordurados. O meu corpo estaria satisfeito e bem alimentado com um bife. Mas a compulsão não respeita essas regras e fui mais longe. Não sei dizer quantos bifes comi naquela noite. Só sei que, na manhã seguinte, acordei com uma sensação estranha. Mas, como havia combinado um horário com minha amiga, não podia perder tempo. Tinha que correr para buscá-la.
No caminho, já comecei a sentir uma coisa estranha. Um enjoo misturado com um desconforto abdominal. Talvez precisasse parar para ir a um banheiro, mas achei q era algo momentâneo, então continuei.
Como se fosse mágica, no momento em que minha amiga entrou no carro, aquelas sensações tomaram forma. O enjoo começou gritar dentro de mim, transformando-se na necessidade de vomitar. E aquele desconforto abdominal me fez entender que havia algo de errado nos meus intestinos, se é que você me entende...
O que fazer? Não ia poder dizer para uma mocinha que eu precisava parar para ir ao banheiro. Não seria britânico da minha parte! O certo, de acordo com a minha crença, era ser forte e seguir viagem.
No caminho, o suor gelado corria solto enquanto eu tentava pensar numa solução ou no melhor caminho para evitar trânsito. Minha amiga, alheia a tudo aquilo, falava como se espera numa relação entre duas pessoas.
_ Eu trouxe suco, você quer?
_ Não.
_ Meu cunhado tem ingressos para a feira do automóvel, você quer?
_ Não.
_ Você gosta de...
_ Não.
Depois de algumas tentativas, quando estávamos no meio do caminho, ela não agüentou e disse:
_ Você não fala muito, né?
E eu tive que dizer a verdade:
_ Sabe o que é, eu acordei mal hoje. Estou com muito enjôo e passando mal por conta do que eu comi ontem à noite. Estou pensando se paro no meio do caminho, se volto para casa ou tento chegar na agência...
Pronto! Ficou pior se eu tivesse feito algo logo no começo do mal estar... Mas agora era tarde demais. Devia correr para chegar o quanto o antes ao nosso destino.
Os 50 minutos do percurso pareceram um fim de semana inteiro para mim e meus intestinos! Mas consegui me salvar.
De qualquer forma, fiquei pensando “por quê?”. Por que eu como mais do que eu preciso? Por que eu fico me fazendo passar mal? Por que eu corro o risco de passar um vexame público sendo que não precisaria nada daquilo?
Vou lembrar esta história para evitar repetir abusos como aquele e sofrimentos como no dia seguinte.